Conhecendo a Bíblia Sagrada

26/05/2013 15:17

Origem e Formação da Bíblia

1. Indícios e evidências históricas

O período histórico da formação da Bíblia situa-se entre 1100 a. C. ou 1200 a. C. a 100 d. C. Provavelmente, a mais antiga parte escrita da Bíblia é o Cântico de Débora, que se encontra no livro dos Juízes (Jz, 5).

Quando os hebreus chegaram a Canaã, já havia na terra um certo desenvolvimento literário, como por exemplo, o alfabeto fenício (do qual se derivou o hebraico), que já existia no século XIV a. C. Os judeus chegaram lá por volta do século XIII a.C. Outro documento desta época é o calendário de Gezér, que data mais ou menos do ano 1000 a.C. É uma indicação de datas para uso dos agricultores. É o documento mais antigo encontrado na Palestina. Outro documento também muito antigo é o sarcófago do Rei Airam, que contém uma inscrição e foi encontrado nos séculos XIV ou XV a. C., em Biblos. Há ainda umas tabuletas encontradas em Ugarit (em 1929), onde estão escritos uns poemas semelhantes aos salmos, datando dos séculos XIV ou XV a. C.

Além destes, há outros documentos provando que já havia uma escrita na Palestina, antes dos hebreus chegarem lá. A inscrição do túmulo de Siloé (700 a. C.), explicando como foi feito; os "óstracon", de Samaria, onde há uma espécie de carta diplomática, são documentos que provam a continuidade de uma atividade literária. Em Juizes 8,14, o autor descreve um acontecimento ocorrido mais ou menos em 1100 a.C. E em que língua foi escrito este fato pela primeira vez, na época em que aconteceu? Provavelmente no alfabeto fenício (pré-hebraico).

2. A tradição oral e a tradição escrita

A parte mais antiga da Bíblia remonta justamente deste tempo (1100 a.C.), quando a escrita ainda não estava bem definida, e é oral. Desde este tempo já se fora criando uma tradição, que existia oralmente e era transmitida aos novos pelos mais velhos nas reuniões que havia nos santuários. Por este tempo, só eram relatados os acontecimentos do deserto, do Sinai, da aliança de Deus com o povo. Mas os jovens queriam saber o que havia acontecido antes disto. Então foram sendo compostas as histórias dos Patriarcas. Mas, e antes deles, antes de Abraão? Passaram à história da criação do mundo. Por isso, se afirma que a parte mais antiga da Bíblia é o Cântico de Débora, no livro dos Juizes. A partir daí, fez-se um retrospecto didático-histórico.

Como dissemos, estas histórias iam sendo passadas oralmente de pai a filho, nos santuários. Acontece que nem todos iam para os mesmos santuários, o que motivou a existência de pequenas diferenças na catequese do norte e na do sul. A tradição do sul foi chamada de JAVISTA (J), pois Deus era tratado sempre por Javé; a do norte se chamou ELOISTA (E), porque Deus era tratado como Eloi.

A tradição oral existiu até os tempos de Daví, quando foi escrita a tradição javista; meio século depois, foi escrita também a eloista. Por volta de 721 a.C., na época, da divisão dos reinos, quando Samaria foi destruída pelos assírios, muitos sacerdotes do norte fugiram para o sul e levaram consigo a sua tradição. A partir de então, as duas foram compiladas num só escrito.

Falamos das duas tradições: uma do norte e outra do sul. Mas não existiam apenas estas duas, que são as principais. Há ainda a DEUTERONOMICA (D), encontrada casualmente em 622 a. C. por pedreiros, que trabalhavam num templo. Corresponde ao livro Deuteronômio da Bíblia atual. Após esta, surgiu a SACERDOTAL (P), nova compilação das catequeses antigas de Israel, datada do século VI a.C. Ao fim, estas quatro tradições foram combinadas entre si e compiladas em 5 volumes, dando origem ao Pentateuco da Bíblia atual. Na tradição Javista, Deus é antropomórfico. Na Sacerdotal, Deus é poderoso, está acima do tempo, o que significa um progresso no conceito de Deus que o povo tinha. A redação do Pentateuco se deu pelo ano 398 a.C. e compreendia a primeira parte da Bíblia judaica.

A partir de Josué, a tradição continuou oral, para ser escrita somente por volta de 550 a.C. E foram escritas do modo como o povo contava. Por isso não se pode dar a mesma importância histórica aos fatos descritos nestes livros em relação a outros posteriores, pois alguns fatos narrados foram baseados na tradição popular, enquanto que outros foram baseados em documentos de arquivos (anais do Reino). Este é um grande desafio para os estudiosos e também uma fonte de divergências.

3. Os Intérpretes - Profetas e Sábios

Durante muito tempo, os profetas foram os orientadores do povo de Deus. Os livros proféticos resumem os seus ensinamentos, e na sua maioria foram escritos só mais tarde, por seus seguidores. Somente por volta do ano 200 a.C. é que foram redigidos os livros proféticos. Os livros Sapienciais foram o resultado de um estilo literário que esteve em moda durante muito tempo, na época posterior ao exílio. São umas reflexões humanistico-religiosas. Passados os profetas, surgiram os sábios que raciocinavam sobre as coisas da natureza, tirando delas ensinamentos para a vida. Foram acrescentados aos livros sagrados nos últimos séculos a.C., sendo os mais recentes livros do AT.

4. A nova tradição da era cristã

O NT não foi escrito com a finalidade de ser acrescentado à Bíblia. No tempo de Cristo e dos Apóstolos, o livro sagrado era apenas o AT. O próprio Jesus Cristo se baseava nele em suas pregações. E Ele mandou apenas pregar, e não escrever. Foi quando uma nova tradição oral foi se formando. E após a morte de Cristo, os apóstolos saíram pregando.

Mas veio a necessidade de congregar outras pessoas para o anúncio, em vista do grande número de comunidades existentes. Então, começaram a escrever. Mais tarde, com a aceitação também de cidadãos estrangeiros nas comunidades, a mensagem precisou ser traduzida e adaptada. Além disso, o próprio povo necessitava de uma escrita (doutrina escrita) para se conservar una, após a morte dos Apóstolos. Esta redação, no início, era apenas de alguns escritos esparsos, que só depois de algum tempo foram juntos em livros. Exemplo disso está em Mc 2, uma série de disputas de JC com os Judeus, onde se vê claramente que foi recolhida de escritos separados. Também em João se lê: "Muitas outras coisas Jesus fez que não foram escritas..." (Jo 21,24) Isto significa que só foram escritas aquelas mensagens que teriam utilidade, conforme as necessidades momentâneas.

O evangelho de Marcos, o primeiro a ser escrito, data dos anos 60 ou 70 d.C.; os de Lucas e Mateus, são de 70 ou 80, o que significa que somente após uns 40 anos da morte de JC sua palavra começou a ser escrita. 0 Evangelho de João só foi escrito em torno do ano 100 d.C. Antigamente, se acreditava ser Mateus o autor do primeiro Evangelho. Mas a critica histórica mostra que o de Marcos foi anterior. Aliás, a respeito deste evangelho de Mateus, não se sabe ao certo quem é o seu autor. Foi atribuído a Mateus, apenas por uma tradição e também por uma praxe da época de se atribuir um escrito a alguém mais conhecido e famoso, para que a obra tivesse mais autoridade.

5. Entendendo algumas dificuldades concretas

Durante o tempo anterior á escrita dos Evangelhos, havia apenas a pregação dos Apóstolos, recordando os fatos da vida de Cristo, todavia eram fatos esparsos, sem nenhuma preocupação com seqüência ou unidade. Por isso os Evangelhos, que foram esta pregação escrita, se contradizem em algumas datas, o que mostra a pouca importância dada à cronologia. Os fatos eram recordados e aplicados, conforme as necessidades. Assim, até entre os Evangelhos sinóticos, que seguiram a mesma fonte, há diversificações. Por exemplo, no Sermão da Montanha, em Lucas fala "bem aventurados os pobres"; e em Mateus, "bem aventurados os pobres de espírito". A diferença consiste no seguinte: Lucas deu um sentido social, mais importante para as comunidades gregas, para as quais escrevia. Mas o de Mateus destinava-se às comunidades judias e queria combater uma doutrina dos judeus que tinham uma idéia falsa de pobreza. Para eles, o próprio fato de a pessoa ser pobre, já lhe garantia a salvação, enquanto outra pessoa, pelo simples fato de ser rica, já estava condenada. Por causa disso ele escreveu "pobres de espírito".

Outro ponto de discordância é o caso da cura de um cego. Mateus diz "um cego, na saída de Jericó"; e Lucas "dois cegos, na entrada de Jericó". 0 fato da 'entrada' e 'saída' pode ser explicado pela existência de duas cidades chamadas Jericó. 0 fato de serem um ou mais cegos explica-se pelo seguinte: era comum naquele tempo os cegos formarem grupos em torno de um cego-lider; e o nome deste geralmente era o do grupo. No entanto, estes detalhes pouco importam ao evangelho. 0 seu interesse é a apresentação da mensagem (evangélion = boa nova).

6. A fonte comum

Os Evangelistas sinóticos se basearam no Evangelho de Marcos e noutra fonte, convencionada por fonte "Q", simbolizando os inúmeros escritos esparsos de que já tratamos. Espalharam cópias destes por outras partes do mundo. Lucas, Mateus, cada um em lugares diferentes, se inspiraram nos escritos disponíveis e inclusive no evangelho de Marcos, que na época já havia sido escrito. O fato do primeiro Evangelho ser atribuído anteriormente a Mateus se deve a uma afirmação de Eusébio de que Mateus escrevera a "logia" do Senhor em aramaico. Mas a crítica histórica provou que o Evangelho que conhecemos não traz apenas a "logia" do Senhor e não foi escrito em aramaico, e sim em grego. Portanto a noticia de Eusébio se refere a outro escrito, e não a este evangelho. Nada impede, porém, que tenha sido escrito por discípulos de Mateus e atribuído ao Mestre. Aliás, a respeito de "Evangelho", o primeiro a usar esta palavra para indicar as memórias dos Apóstolos foi S. Justino, em 130 d.C.

7. As Cartas

As cartas de Paulo foram enviadas para serem lidas em público. Em I Tes 5, 27 há uma alusão a isto. Havia também o intercâmbio das cartas, como se lê em Col 4,16: "mostrem esta carta para Laodicéia e tragam a de lá para vocês". Aos poucos as cartas foram colecionadas, e no fim do I século já se tem notícia delas, quando em II Ped 3,15 se lê: "...nosso irmão Paulo vos escreveu conforme o dom que lhe foi dado... " As cartas de Paulo foram os primeiros escritos do NT. Não se sabe quando os Evangelhos e elas foram acoplados, mas já no fim do I século estavam reunidos num só livro.

As Epistolas Católicas (universais) são chamadas assim por se destinarem à Igreja em geral, e não a tal ou qual comunidade, como fizera Paulo. Elas também se originaram da necessidade pastoral, e já no começo do II século estavam incorporadas aos outros escritos do NT. Os Atos dos Apóstolos podem ser considerados a continuação do terceiro Evangelho, pois também foi escrito por Lucas. E o Apocalipse de S.João, livro profético, foi acrescentado por último.

Nos escritos do NT, freqüentemente se encontram citações do AT. É que muitas vezes os Apóstolos queriam tirar dúvidas sobre certas passagens, que tinham falsa interpretação. Nas assembléias, eram lidos escritos do AT e do NT, para explicá-los. Exemplo disto temos em I Tes 4,15; I Cor 7,10.25.40; At 15, 28; I Tim 5,18; Lc 10,7.

8. O Cânon Sagrado

No século IV, a Igreja se reuniu em Concilio em Nicéia, e uma das tarefas era organizar o "cânon", ou a lista de livros sagrados considerados autênticos. Neste Concilio, os livros foram estudados e se investigou quais os que sempre foram lidos nos cultos e sempre foram considerados legítimos. E se estabeleceu a ordem ainda hoje conservada. O motivo pelo qual alguns livros foram postos em dúvida era a grande quantidade de livros apócrifos, que fazia com que se duvidasse dos verdadeiros. Havia muitos livros que os judeus não aceitavam. Então os Ss. Padres ponderaram os prós e contras e definiram a lista que foi aprovada.

Conhecendo a Bíblia Sagrada

1. Prólogo

A Bíblia é um livro difícil. Difícil porque é antigo, foi escrito por orientais, que têm uma mentalidade bem diferente da greco-romana, da qual nós descendemos. Diversos foram os seus escritores, que viveram entre os anos 1200 a.C. a 100 d.C. Isso, sem contar que foi escrita em línguas hoje inexistentes ou totalmente modificadas, como o hebraico, o grego, o aramaico, fato este que dificulta enormemente uma tradução, pois muitas vezes não se encontram palavras adequadas.

Outra razão para se considerar a Bíblia um livro difícil é que ela foi escrita por muitas pessoas, ás vezes até desconhecidas e em situações concretas as mais diversas. Por isso, para bem entendê-la é necessário colocar-se dentro das situações vividas pelo escritor, o que é de todo impraticável. Quando muito, consegue-se uma aproximação metodológica deste entendimento.

Além do mais, a Bíblia é um livro inspirado e é muito importante saber entender esta inspiração, para haurir com proveito a mensagem subjacente em suas palavras. Dizer que a Bíblia é inspirada não quer dizer que o escritor sagrado (ou hagiógrafo) foi um mero instrumento nas mãos de Deus, recebendo mensagens ao modo psicográfico. É necessário entender o significado mais próprio da 'inspiração' bíblica, assunto que será abordado na continuação.

Entre os católicos, o interesse por conhecer a Bíblia praticamente começou após o Concílio Vaticano II, ou seja, a partir dos anos '60, enquanto os Protestantes há muito se interessam por estudá-la. Não quero adentrar aqui na histórica polêmica religiosa que cerca a leitura e a interpretação da Bíblia, ressuscitando vetustas divergências. Apenas vale salientar que uma série de enganos podem advir de uma interpretação bíblica literal, porque uma interpretação ao "pé da letra" não revela o sentido mais adequado de todas as palavras.

Para que não aconteça conosco incidir neste equívoco, devemos aprender a nos colocar na situação histórica de cada escritor em cada livro, conhecer a situação social concreta da sociedade em que ele viveu, procurar entender o que aquilo significou no seu tempo e só então tentar aplicar a sua mensagem ás nossas circunstâncias atuais.

1. O que é a Bíblia?

Definição do Concilio Vaticano II:

"A Bíblia é o conjunto de livros que, tendo sido escritos sob a inspiração do Espirito Santo, têm Deus como autor, e como tais foram entregues à Igreja".

TESTAMENTO (novo ou antigo): é a tradução da palavra hebraica "berite" que significa a aliança de Deus com o povo por Moisés. Na tradução dos 70 a palavra "berite" foi traduzida por "diatheke", que em grego quer dizer aliança, contrato, testamento.

OBS: A 'tradução dos 70' é uma das versões mais antigas da Bíblia. Segundo a tradição, este trabalho teria sido realizado por 70 sábios da antiguidade.

2. Quais as partes que compõem a Bíblia?

A Bíblia se divide em duas partes principais: o Antigo Testamento e o Novo Testamento. O Antigo refere-se ao período anterior a Jesus Cristo e o Novo se refere ao período cristão. Cada uma destas partes se compõe de diversos 'livros', escritos em épocas históricas diferentes. A seguir, a relação dos livros com uma breve referência ao conteúdo deles.

LIVROS DO ANTIGO TESTAMENTO

  1. Pentateuco (cinco primeiros livros: Gênesis, Êxodo, Levitico, Números, Deuteronômio)
  2. Josué (narra a entrada do povo de Deus na Palestina)
  3. Juizes (narra a conquista da Palestina)
  4. I e II de Samuel (relatos da época de Saul e Davi, continuação da conquista)
  5. I e II dos Reis (relatos sobre Salomão e seus sucessores)
  6. I e II das Crônicas (continuação dos relatos sobre os outros Reis)
  7. I e II dos Macabeus (continuação do período dos Reis)
  8. Livro de Rute (faz alusão ao universalismo. Noemi era pagã e se inseriu no povo de Deus).
  9. Livro de Tobias, Livro de Judite, Livro de Ester (pertencem ao gênero de contos. São livros do tempo do exílio, quando se apresentavam exemplos de abnegação ao povo oprimido, convidando-os a suportar o sofrimento).
  10. Livro de Isaías (cap.l a 39 são do próprio escritor; cap. 40 a 55 são de discípulos; cap.56 a 66 são de outros escritores posteriores)
  11. Livro de Jeremias (ditado por este a Baruc, seu secretário)
  12. Livro de Ezequiel (um dos profetas maiores)
  13. Livro de Daniel (tem um conteúdo apocalíptico )
  14. Livro de Jó (do gênero conto, procura demonstrar que não só os bons são felizes. Tem por objetivo combater uma idéia comum de que só os ricos eram os abençoados por Deus).
  15. Livros Sapienciais (Eclesiastes ou Qohelet; Eclesiástico ou Siráside; Provérbios, Sabedoria e Cântico dos Cânticos). São reflexões de cunho acentuadamente humanístico, aproveitamento do saber oriental.
  16. Livro dos Salmos (coleção de cantos litúrgicos).
  17. Profetas Menores: Oséias, Joel, Amós, Abdias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias (chamados menores não com relação à sua importância, mas ao tamanho de seus escritos).

LIVROS DO NOVO TESTAMENTO

  1. Evangelhos sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas - têm muitas semelhanças entre si ).
  2. Evangelho de João (maior desenvolvimento teórico, influência filosófica de época)
  3. Atos dos Apóstolos (narram a missão dos apóstolos após a Ressurreição de Cristo)
  4. Epístolas de Paulo (historicamente, os primeiros escritos do NT)
  5. Epístolas Católicas (Pedro, Tiago, Judas): dirigidas a todos os fiéis, por isso, universais.
  6. Apocalipse (escrito por João, na base de códigos, símbolos).

Conhecendo a Bíblia Sagrada

2. Inspiração

Um dos principais conceitos a ser examinado para uma melhor compreensão da Bíblia é o de inspiração. O que significa dizer que os livros bíblicos são inspirados, de onde vem esta inspiração, até que ponto o que é escrito representa a mensagem de Deus ou do hagiógrafo (escritor sagrado)? Ao longo da história, os estudiosos procuraram esclarecer este conceito básico e, é claro, sempre houve divergências entre eles. Apresentamos aqui algumas reflexões sobre este importante conceito.

Na inspiração distinguimos dois aspectos: dogmático e especulativo.

O dogmático pode ser expresso como resposta à pergunta: por que acreditamos que a Bíblia é um livro inspirado? Isto não se pode provar pela própria Bíblia. Busca-se então provar pelo fundamento histórico. Os evangelhos, por exemplo, são históricos. Há uma tradição desde os tempos dos Apóstolos que cita a Escritura como autoridade divina ( Mt 1, 22; Mt 22, 31; Mc 7,10; Jo 10, 35; At 1,16; Lc 22, 37; Heb 3, 7; 10,15 ). Em 2Tim 3,16, aparece pela primeira vez a palavra 'theopneustos', ou seja, inspirada por Deus.

O especulativo pode ser expresso como resposta à pergunta: em que consiste a inspiração? Este é mais complicado e será exposto com mais detalhes.

a) Modo da inspiração

É muito discutido o modo como se dá a inspiração do escritor sagrado. Bañez afirmou que era um ditado. Mas em II Mac 2, 19-23, o autor se refere a um resumo de 5 livros em um só, cujo resumo lhe custou "suores e noites de vigília". Como é que foi um ditado se houve o esforço dele para elaborar a síntese? Do mesmo modo Lucas (Lc l,1) escreve: "depois de haver diligentemente investigado tudo desde o principio, resolvi escrever... ", logo não foi simplesmente um 'ditado' da parte de Deus.

Em reação à teoria do ditado veio outra que disse o contrário: a inspiração é a aprovação que a Igreja dá ao livro. O fato estar colocado no cânon é a garantia da própria inspiração. Esta tese foi defendida por poucos e não teve grande aceitação nos meios católicos.

O Cardeal Franzelin propôs uma nova fórmula: nem tudo é de Deus nem tudo é do homem, mas as idéias são de Deus e as palavras são do homem. Obteve um certo sucesso, mas ainda não explicou de todo. Sto. Tomás de Aquino propusera a teoria da "causa instrumental": são os dois ao mesmo tempo - Deus e o Homem. Ambos estão presentes em toda a obra, Um é o autor principal e o outro o autor secundário. A inspiração eleva, sublima as faculdades do autor. Pode até ser admitida esta teoria, entretanto, convém lembrar que tudo que está na Bíblia é inspirado, embora nem tudo seja revelado.

b) Funcionamento psicológico da inspiração

Em II Mac, conforme mencionado acima, o autor se refere a um resumo do livro que um certo Jazão escreveu. De 5 volumes ele reduziu a um só. Como dizer que isto é palavra inspirada por Deus, como se explica aí a inspiração divina?

Comecemos por analisar as operações do intelecto: apreensão, juízo e raciocínio. Elas seguem um grau de aprofundamento e refinamento do saber. Pode-se ter uma inspiração de Deus logo no primeiro momento (na apreensão), como se pode ter depois, no juízo ou também nos dois. Quando a inspiração é logo na apreensão, se diz 'revelação'. Quando, como no caso do II Mac, a apreensão é do autor, a inspiração se dá no segundo momento, ou seja, no juízo, enquanto na apreciação que ele faz da obra está sendo iluminado pelo Espírito Santo. Na confecção destes livros, a questão da inspiração é que o autor estava iluminado pelo Espirito Santo para dizer o fato corretamente, sem poder errar no julgamento. Embora ele não esteja consciente disso, a ação do Espírito Santo está sendo exercida no seu intelecto.

Mas, pode-se questionar: como se sabe se ele foi ou não inspirado quando nem ele mesmo pode perceber isso? Aí passa a ser uma questão de fé. Tenta-se explicar o fato, mas não se afirma que seja assim. 0 discernir se o livro é ou não inspirado, dado o que acontece com o autor, é alçada da Igreja, que também é inspirada pelo Espírito Santo. É uma questão fundamentalmente de fé.

Por isso, para a definição do livros autênticos, reconhecidos pela Igreja Católica, os Cânones foram aprovados em Concílios, nos quais se discutiram certas dúvidas a respeito de alguns livros, se eram ou não inspirados. Nas discussões, procurou-se ver na historia da Igreja, desde os cristãos primitivos até aquela época, quais os livros que durante os séculos sempre foram lidos nas Igrejas e, baseada no consenso, ela constituiu o cânon. Sem dúvida, a tradição antiga é mais fidedigna, pois está mais próxima dos tempos apostólicos.

Mas, voltando ao conceito do juízo, ele pode ser especulativo ou prático. Especulativo quando tem por fim o verdadeiro; prático guando tem por fim o bem. No caso de Jonas, por exemplo, o juízo do autor não foi especulativo, mas prático. Jonas teve o sonho em que Deus o mandava pregar em Nínive. Ora, raciocinou ele, Javé é Deus de Israel, e não deve ser falado aos pagãos. Então tomou o navio para outro lugar, e aí entra a história da baleia... A finalidade do autor era convencer a todos que Javé era o Deus universal, contra uma certa corrente judia que negava fato, ou melhor, não gostava da idéia.

Para se entender cada página da Bíblia deve-se ter em mente a finalidade, a intenção do autor ao escrever cada parte do livro. Não se pode abrir o livro em qualquer parte e ler tudo com o mesmo espirito. Na antiga concepção de inspiração (ditado) não se considerava este problema. Tudo que lá estava se acreditava "ao pé da letra". Não se podia duvidar. Mas esta é hoje uma prática mais comum em algumas igrejas protestantes, geralmente praticada por pessoas com conhecimentos teológicos limitados e reducionistas.

Uma conseqüência direta da inspiração é o dom da inerrância. Se o livro é inspirado, logo o que contém é verdade. Porém esta verdade não está ali imediatamente evidente, ela precisa ser alcançada pela reflexão animada pela fé, ou seja, a razão e a fé ajudando-se mutuamente.

História das Formas e Gêneros Literários

1. HISTÓRIA DAS FORMAS ("FORMGESCHICHTE")

É o padrão da exegese moderna. Em geral todo método exegético moderno aborda os seguintes tópicos:

a) critica textual - se os manuscritos originais desapareceram ou nunca foram encontrados, como se sabe se o texto atual corresponde ao original? Até que ponto é fiel? Em 1008, foi encontrado um manuscrito básico para a edição da melhor bíblia hebraica que se tem hoje. Está no museu de Leningrado. Mas, questiona-se: por quanto tempo o livro foi sendo recopiado, e foi adquirindo erros de escrita? Muitas vezes, vários manuscritos (cópias) de um mesmo livro trazem palavras diferentes. E por que tanta fé neste manuscrito?

O manuscrito mais antigo (até pouco tempo) do AT era composto de fragmentos de um papiro do I ou II século a.C. Os beduínos acharam às margens do Mar Morto vários manuscritos datando do II século a.C. e há alguns, como o livro de Isaías, cujo texto é quase completamente igual ao que temos. A Bíblia original (copiada) data do século II d.C. Os rabinos tinham muito cuidado em transmitir a doutrina, e procuravam unificar os textos. Os textos velhos eram colocados em lugares onde ninguém podia mais usá-los, chamados gezidas. Numa destas gezidas foi encontrado um documento do ano 800, aproximadamente, do qual aquele de 1008 é cópia. A diferença entre ambos é pouquíssima. Ora, se a nossa Bíblia é a tradução daquele manuscrito, considerado autentico, aquela Bíblia é a melhor.

b) 'sitz in leben'- Há livros que antes de serem escritos, foram passados oralmente por várias gerações. Cada manuscrito que serviu para a composição de um texto tem uma história diferente. Por isso eles dividem as perícopas e estudam as tradições e fontes delas. E como o manuscrito chegou a esta fonte? Deste estudo se deduz a 'sitz in leben' (situação na vida) deste manuscrito no gênero literário. A 'sitz in leben' que este gênero literário tem na comunidade; a 'sitz in leben' desta comunidade na história.

c) história da redação - Por que há certas palavras a mais ou a menos nos Evangelhos? Isto varia com a 'sitz in leben' do manuscrito. Quem determina isto é a critica literária. Tudo isto dentro do estudo da história das formas.

2. PRINCIPAIS GENEROS LITERÁRIOS DA BÍBLIA

Dividem-se assim os diversos gêneros literários encontrados na Bíblia:

a) Narrativo: histórico e didático

b) Legislativo

c) Sapiencial

d) Profético

e) Cânticos

a) narrativo-didático: mito, saga, legenda, conto, fábula, alegoria, parábola

l. mito - conto que se passa com deuses, ou cujos personagens são os deuses. Têm tonalidade solene e são originários de círculos politeístas. A mitologia babilônica, por exemplo, muito influenciou no povo de Israel, que sempre foi monoteista. Isto se vê nos salmos 103, 6-9; 17, 8-16; 88, ll e nos proféticos: Job 26, l2. Nos livros históricos, a influência é mais velada. Mas a árvore da vida do Gênesis já existe num poema de Gilgames (de origem Babilônica): um herói perguntou a um seu antepassado que era deus, onde ficava a árvore da vida. Ele a encontrou no fundo do mar, e levou um ramo para plantar. Tendo sede, foi beber num poço e uma serpente levou o seu ramo. A história do dilúvio tem uma similar na cultura babilônica. É o caso de uma deusa que era amada ao mesmo tempo por um deus e por um homem. Então para matar o homem, o deus mandou o dilúvio.

O importante a se notar nisso tudo é que, ao ser transcrita para o livro sagrado, o autor purifica a lenda, tirando as características politeístas e servindo-se da cultura popular para levar uma mensagem. A árvore da vida, na bíblia, significa que o homem foi criado para não morrer. Na sabedoria babilônica, explicam que o mundo nasceu de uma briga dos deuses. O deus vencido foi partido ao meio. De uma metade fez o deus vencedor o céu; de outra fez a terra. Depois pediu a um deus artista que fizesse o homem com o sangue apodrecido do deus vencido. Por isso, o homem e o mundo são maus do principio. O autor sagrado aproveita-se destes elementos, mas purificando-os e adaptando-os. A tradicional briga dos anjos com Lucifer existe num mito fenício sob a forma de uma briga de deuses. A linguagem mítica da bíblia, o antropomorfismo de Deus... tudo isto tem origem desta inspiração na literatura exterior a Israel.

2. saga - contos que se ligam a lugares, pessoas, costumes, modos de vida dos quais se quer explicar a origem, o valor, o caráter sagrado de qualquer fenômeno que chama a atenção. A saga se chama etiológica quando procura a causa de um fenômeno. Por exemplo, para explicar a existencia de uma vegetação pobre e espinhosa na região sul ocidental do Mar Morto, surgiu a lenda de Sodoma e Gomorra, a chuva de enxofre... A origem de várias estátuas de pedra, formadas pela erosão é explicada pela história da mulher de Ló, que foi transformada em estátua. A narrativa de Caim e Abel é outra, para explicar a origem de uma tribo cujos integrantes tinham um sinal na testa. Explicavam que Deus colocara um sinal em Caim para que ninguém o matasse, e daí este sinal ficou para a descendência. O próprio nome de Caim é inventado, porque a tribo tinha o nome de cainitas e eles deduziram que seu fundador devia chamar-se Caim.

A saga se chama etimológica quando é para explicar um nome. Existe na Palestina uma Ramat Leqi (montanha da queixada). Para explicar a origem deste nome eles inventaram a estória de Sansão, um homem muito forte, que lutara contra muitos inimigos usando uma queixada, e os vencera. Depois ele jogou a queixada naquele monte, que ficou c conhecido como monte da queixada. 0 caso das filhas de Ló (Gen, 19) é uma história difamatória contra os amonitas e moabitas, tradicionais inimigos de Israel. (Amon e Moab significam 'do pai'). Outras sagas da Bíblia: a de Noé embriagado; a briga de Labão com Jacó (Gen 31). A saga se chama heróica quando tem por finalidade engrandecer a vida dos heróis do passado. O valor da saga está na riqueza popular (folclórica) que ela traz. Nem sempre há lição em cada uma. Mas a fartura de detalhes que ela traz mostra a mentalidade do povo. Seu valor é maior para a critica literária.

3. legenda - distingue-se da saga porque se refere a pessoas ou objetos sagrados e querem demonstrar a santidade destes por meio de um fato maravilhoso. Legendas na Bíblia há em Num 16,1 - 17,15: histórias a respeito de Moisés; Dan l, 2, 3, 4: sonhos de Daniel; Os milagres de Elias contra os sacerdotes de Baal; Gen 28,10: Jacó sonha com os anjos (pedra de Betel). É comum nas legendas referir-se à lei ou objeto de culto. A imolação de Isaac, que não deu certo, é para reprimir um costume dos cananeus de imolar crianças, costume proibido pela lei de Moisés. A serpente de bronze (Num 21) se refere a uma serpente de bronze mandada fazer pelo rei Manassés, que foi destruída por Javé. A circuncisão (Gen 17) é explicada assim: Deus apareceu a Abraão para fazer aliança com ele e o pacto era a circuncisão de todos os meninos no oitavo dia. Jos 5, 9 e Ex 12 e 13 falam da origem da Páscoa.

4. parábolas, fábulas, alegorias - parábola é uma história comparativa, de sentido global (ex: II Sam 12, 1-4); fábula é a narrativa que faz os seres inanimados ou os animais falarem (ex: Juízes, 9,7); alegoria é uma história comparativa em que cada elemento tem um significado particular (ex: Is 5, 1-7). Há ainda o apólogo, quando se trata da animação de objetos.

b) narrativo-histórico

Difere do didático porque pretende contar um fato acontecido realmente. Há três tipos:

1. popular, onde ninguém sabe o fim da lenda e o começo da história. É uma história primitiva, baseada em histórias que corriam na boca do povo, um misto de elementos verídicos e legendários acrescentados. Os livros Josué e Juízes (550 a.C.) estão nesta categoria.

2. epopéia (nacional-religiosa) são histórias retiradas da catequese do povo. Se bem que tenham elementos acrescentados, todavia a mensagem pode ser considerada autêntica. O exemplo mais típico deste gênero é a narração epopéica da passagem do mar vermelho (Ex. 14 ). A fuga de Israel do Egito está ligada a um fato acontecido no tempo de Ramsés II. Ele foi um faraó que empreendeu grandes conquistas, principalmente à procura de escravos para trabalhar. Entre os povos submetidos havia um grupo de judeus. Mais tarde, fraquejou a vigilância, e muitos fugiram, inclusive muitos judeus. Então eles empreenderam a fuga pelo deserto e se aproveitaram de uma região onde havia um braço de mar que secava durante a maré baixa para sair do território egípcio.

Esta narrativa na Bíblia é contada com todos aqueles retoques conhecidos. Mas se analisarmos bem, veremos que na própria Bíblia, há duas citações do mesmo fato, e cada uma conta diferente. São as duas tradições: a javista, mais antiga e mais verdadeira, afirma que o vento soprou durante toda a noite e fez o mar recuar; a sacerdotal, mais recente, modificou a narração para a divisão das águas em duas muralhas por onde todos passaram em seco. Há uma certa contradição nestas duas. Mas o que se deve concluir daí é que os soldados os perseguiram na fuga e eles passaram na maré baixa. Quando os soldados chegaram, a maré já subira e não dava passagem. Enquanto isso, eles se adiantaram ainda mais. Ao transcrever isto na Bíblia, o autor sagrado quer mostrar o fato da presença de Deus em ajuda de seu povo, através dos elementos da natureza.

3. historiográfico - é o trabalho dos escribas encarregados de escrever as crônicas dos anais dos reis. A partir destas crônicas vários livros foram escritos. 0 I Reis, cap. 11, vers.41 cita os anais de Salomão; em 14, 19 afirma que o restante está nos livros das crônicas dos Reis de Israel. São documentos de maior credibilidade, porque são mais históricos. Somente a partir do livro dos Reis, é que são usados documentos escritos na época. Antes era apenas história popular.

c) Legislativo

É representado na Bíblia principalmente no Pentateuco. Tem muito em comum com os outros povos vizinhos e herdou muito deles. Há passagens na Bíblia que são repetições do código de Hamurábi. Os povos orientais são muito ricos neste tipo de literatura. Quanto aos tipos de leis, há três: 1. leis causídicas: pormenorizadas conforme as situações; 2. leis apodíticas: universais; 3. leis rituais.

d) Sapiencial

Originou-se também dos povos vizinhos, principalmente a partir do Exilio. São de origem profana e não religiosa, pois as suas fontes também não eram religiosas. 0 povo oriental é pensador por natureza e a sabedoria é uma virtude muito difundida e apreciada. A sabedoria bíblica não difere muito da sabedoria oriental em geral.

e) Profético

Também tem origem fora de Israel. Os povos da época tinham seus profetas. Eles moravam nos palácios dos reis e eram os que dialogavam com os deuses. É preciso notar que naquela época profeta não era sinônimo de adivinho, como às vezes se identifica. Eles·manifestavam ao povo a vontade de Deus com sermões, com sinais, exortações e oráculos.

f) Salmos

Também tem influência externa (fora de Israel). Não são todos de Davi. Apareceram conforme as necessidades. Foram compostos sem sequência ou cronologia. São cantos de louvor, de súplica.

PRINCIPAIS ETAPAS DA HISTÓRIA DE ISRAEL

O primeiro marco importante na história politica·de Israel foi o exílio. Sua finalidade politica era para evitar a rebelião. Em geral, quando era conquistado um povo muito numeroso, os conquistadores achavam perigoso deixá-los em suas terras de origem, porque isso lhes facilitava um trabalho oculto de rebelião para expulsar os invasores. Então, longe de suas terras e sem uma liderança, eles não podiam se movimentar. Os judeus foram assim exilados para a Babilônia. 0 exílio teve início no ano 587 e foi concluído com o edito de Ciro que, em 538 conquistou a Babilónia e libertou os judeus.

Dizem os historiadores que a rivalidade entre judeus e samaritanos começou na volta do exílio. O povo no exilio ficou muito tempo em contado com vários povos estrangeiros e adquiriu com isto um sincretismo religioso que levaram para a Pátria. Ao retornarem à patria, logo eles empreenderam a reconstrução de Jerusalém (casas, templo...), mas não se livraram completamente das influências politeístas, causando assim várias brigas internas.

O Sinédrio era a cúpula religiosa da nação, composta de 70 membros sob a presidencia do Sumo Sacerdote, que tinha autoridade suprema. Os fariseus e saduceus eram partidos politicos, mas com inspiração religiosa. Os primeiros eram da oposição e os outros, da situação. No ano 63 a.C, a Palestina foi conquistada pelos Romanos, iniciando outra era de dominação estrangeira, que perdurou até o tempo de Cristo.

CRONOLOGIA BÍBLICA

* séc.XIX (1850 a.C) - migração de Abraão.

* séc.XIII - libertação do Egito; êxodo (1225 a.C.); aliança no Sinai.

* séc X - (1013 a 973 a.C) - Tempo do Rei Davi. Foi escrita a tradição javista (sul); (970 a 930 a.C) - Tempo do Rei Salomão. Foi escrita a tradição eloista. (norte); (930 a.C) - divisão dos reinos.

* séc VIII (722 a.C) - queda de Samaria para o exército de Sargão II, Profetas escritores.

* séc VII (586 a.C) - queda de Jerusalem para Nabucodonosor, rei da Babilônia; (538 a.C) - edito de Ciro, volta do exílio.

* séc III (300) - tradução dos 70.


 

As Origens

  1. DEUS CRIA O MUNDO A PARTIR DO NADA
    No princípio, Deus criou o céu e a terra. A terra era ainda informe e vazia; estava coberta de águas e havia trevas por toda a parte.
    Deus disse então: "Exista a luz" e a luz apareceu. Separou a luz das trevas e chamou à luz de "dia" e às trevas de "noite". Este foi o primeiro dia.
    E Deus disse: "Faça-se um firmamento que separe as águas umas das outras" e assim se fez. Deus chamou ao firmamento de "céu". Foi o segundo dia.
    E Deus disse: "Ajuntem-se as águas que estão debaixo do céu num só lugar e apareça o solo firme" e assim se fez. Deus chamou ao solo firme de "terra" e ao conjunto das águas de "mar". E Deus disse: "Que a terra produza ervas, plantas e árvores que dêem frutos, cada qual segundo sua espécie" e assim se fez. Foi o terceiro dia.
    E Deus disse: "Haja corpos luminosos no firmamento" e assim se fez. Deus criou então dois grandes astros: o maior para presidir ao dia e o menor para presidir a noite. Criou também as estrelas. Foi o quarto dia.
    E Deus disse: "Povoem-se as águas de seres vivos e voem aves sobre a terra, debaixo do firmamento do céu". Deus criou então os peixes nas águas e as aves nos ares. Abençoou-os e disse-lhes: "Crescei e multiplicai-vos". Foi o quinto dia.
    E Deus disse: "Produza a terra seres vivos de toda a espécie: animais domésticos, répteis e feras" e assim se fez.
     
  2. DEUS CRIA O HOMEM
    Em seguida, Deus disse: "Façamos o homem à nossa imagem e semelhança; que ele domine os peixes do mar, as aves do céu, os animais e toda a terra. Deus formou então o corpo do homem com o barro da terra e comunicou-lhe um sopro de vida. Ao primeiro homem deu o nome de "Adão". Foi o sexto dia.
     
  3. DEUS INSTITUI O SÁBADO
    No sétimo dia Deus descansou. Abençoou este dia e o santificou.
    [Deus também criou um mundo invisível, o dos espíritos inumeráveis chamados anjos. Eram bons e felizes, mas muitos deles pecaram por orgulho e foram precipitados no Inferno; são os espíritos maus ou demônios].
     
  4. O HOMEM NO PARAÍSO
    Deus plantara para o homem um jardim de delícias ou Paraíso, onde fez crescer árvores de todas as espécies, formosas à vista e carregadas de frutos deliciosos.No meio, erguia-se a árvore da ciência do bem e do mal.
    Deus colocou o homem neste jardim para o cultivar e guardar. E disse: "Podes comer dos frutos de todas as árvores do jardim, exceto da árvore da ciência do bem e do mal. Se comeres do fruto dessa árvore, morrerás".
     
  5. DEUS CRIA EVA
    Em seguida Deus disse: "Não é bom que o homem esteja só. Façamos-lhe uma auxiliar semelhante a ele". Mandou então um sono profundo a Adão e, tirando uma das suas costelas, formou com ela uma mulher. Quando Adão acordou, Deus a apresentou. Assim que a viu, Adão exclamou: "Eis o osso dos meus ossos e a carne da minha carne". Adão chamou à mulher de "Eva", que significa mãe de todos os viventes.
     
  6. EVA E ADÃO COMETEM O PECADO
    O demônio invejava a felicidade dos homens. Para os enganar, disfarçou-se em forma de serpente e disse à mulher: "Por que Deus vos mandou que não comesseis dos frutos destas árvores?". A mulher respondeu: "Nós podemos comer do fruto de todas as árvores. Só nos é proibido o fruto da árvore que está no meio [do jardim]. O Senhor mandou que nem a tocássemos, senão poderíamos morrer". A serpente replicou: "Nada disso, vós não morrereis. Assim que comerdes deste fruto, ficareis com os olhos abertos e sereis como Deus, conhecendo o bem e o mal".
    Então a mulher pensou que seria bom comer desse fruto, que tão formoso lhe parecia. Apanhou um e comeu e depois o deu a seu marido, que comeu também. Imediatamente se abriram os olhos de ambos e perceberam que estavam nús. Costuraram folhas de figueira e fizeram cintos para se cobrir. Mas sentindo que Deus se aproximava, esconderam-se debaixo das árvores do jardim.
     
  7. ADÃO E EVA CONFESSAM A SUA FALTA
    Deus chamou por Adão, dizendo: "Onde estás?". Adão respondeu: "Sentindo que vos aproximavas, tive medo porque estava nú e escondi-me".Disse-lhe Deus: "Como soubeste que estavas nú? Acaso comeste do fruto da árvore proibida?". Adão respondeu: "A mulher que me deste por companheira deu-me do fruto desta árvore e eu comi".Então o Senhor disse à mulher: "Por que fizeste isso?". Ela respondeu: "Foi a serpente que me enganou".
     
  8. DEUS PROMETE O REDENTOR
    Deus disse à serpente: "Já que fizeste isso, serás maldita entre todos os animais. Andarás rastejando sobre o teu peito e comerás terra todos os dias da tua vida. Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a sua raça e a tua; ela te pisará a cabeça e tu procurarás atingí-la no calcanhar".
     
  9. DEUS CASTIGA O HOMEM PECADOR
    À mulher [Deus] disse: "Terás grandes sofrimentos e muitos desgostos com teus filhos. Estarás sob o poder do marido e ele será o teu senhor".
    A Adão disse: "A terra será maldita por tua causa. Por si só não produzirá além de espinhos e cardos. Comerás o pão com o suor do teu rosto até que voltes à terra de que foste tirado, porque tu és pó e ao pó irás retornar".
    Depois Deus vestiu Adão e Eva com umas túnicas de peles e os expulsou do Paraíso. Pôs à entrada do Paraíso querubins armados com espada de fogo para guardar o caminho da árvore da vida.